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Origami de Proteínas para salvar vidas

Origami é a arte de se fazer dobraduras em papel. Uma tradição centenária no Japão, que celebra a paz e a harmonia. A partir de uma forma plana, o papel, criam­-se formas tridimensionais maravilhosas imitando a natureza, com uma técnica apurada de dobraduras sequenciais que leva anos de prática para se aprender.

Mas o que tem a ver origami com proteínas? Explico, começando com uma explicação simplificada do que é uma proteína e qual é sua função, pelo GPT4: “Uma proteína é uma molécula complexa e grande composta por cadeias de aminoácidos. Ela desempenha uma ampla variedade de funções essenciais em organismos vivos, incluindo a regulação de processos bioquímicos, o transporte de moléculas e a proteção contra infecções. As proteínas são encontradas em todas as células vivas e são essenciais para a estrutura, função e regulação dos tecidos e órgãos do corpo humano”.

Quem gera as proteínas necessárias para a vida orgânica é o DNA, baseado nas receitas contidas nele, em suas sequências de nucleotídeos (A, C, G, T). Essas cadeias de aminoácidos, que podem ser muito grandes, contêm ligações entre si que não são necessariamente “planas” ou “sequenciais”. Como um origami, as pontas e laterais dessas cadeias se dobram para formar novas ligações, gerando uma estrutura em três dimensões.

Portanto, a quantidade de aminoácidos, a sequência que tem na estrutura e as ligações que apresentam entre si é que determinam a aparência final de uma proteína específica. E podemos definir a função de uma proteína por sua forma. O número de proteínas diferentes encontradas na Natureza é quase infinito, pode-se encontrar proteínas diferentes em um número quase infinito.

Identificar essas estruturas, saber quais são suas funções e onde atuam no organismo é fundamental para o desenvolvimento de novos medicamentos, como vacinas sintéticas. Por exemplo, proteínas que ensinariam nosso organismo a defender-se de cepas virais distintas da Influenza e do Sars-CoV-2 poderiam ser juntadas numa única vacina aplicada com borrifador nasal. Isso ampliaria, de forma atualizada e com baixo custo, a cobertura vacinal da população mundial, dando acesso para as populações mais pobres do mundo.

O principal pesquisador nessa área é o estadunidense David Baker. Bioquí­mico e biólogo, é professor da Universidade de Washington, em Seattle. Fundou e dirige o Instituto de Design de Proteínas (Institute for Protein Design) daquela universidade, que é dedicado a identificar e estruturar modelos sintéticos de prote­ínas, utilizando técnicas de modelagem computacional.

Com a ferramenta digital desenvolvida pelo instituto é possível “criar” mode­los de proteínas através da inserção de diretivas como o ambiente em que atuará, limitações de atividade e para que servirá esta pretendida proteína sintética. Aí que entra a “sacada” do doutor David Baker. Poucos anos atrás, experimentando alguns “bots” de criação de imagens por Inteligência Artificial, imaginou ser possível que em vez de pedir para o “bot” criar gatinhos em 3D, por que não pedir que criasse uma estrutura 3D de proteínas já conhecidas? A partir daí, em conjunto com o Departamento de Pesquisa de Inteligência Artificial da própria Universidade de Washington, surgiu o Instituto de Design de Proteínas, hoje o mais avançado centro de pesquisas na área.

A ferramenta cooperativa “RoseTTAFold”, do IPD já identificou milhares de proteínas e formulou o modelo sintético de muitas delas. O trabalho-chave desse instituto foi a formulação da vacina Covax, que foi distribuída, de forma gratuita pela OMS, devido seu baixo custo de aquisição, para os países mais pobres, durante a pandemia. Hoje a principal pesquisa gerada a partir de um trabalho do Instituto de Design de Proteínas é a do combate à Doença Celíaca, que é uma doença autoimune, que impede o organismo de processar o glúten e pode provocar graves problemas aos portadores. A proteína “KumaMax” foi desenhada em um projeto dentro do Instituto e o trabalho foi adquirido pela empresa japonesa Takeda Pharmaceuticals, que está desenvolvendo o medicamento que estará no mercado em breve.

A Inteligência Artificial pode ajudar, e muito, a Humanidade. Porém, uma Carta Aberta publicada nesta semana pelo Instituto da Vida do Futuro (Future of Life Institute) e assinada por empresários e pesquisadores do mais alto calibre, como Elon Musk (Tesla, SpaceX), Steve Wosniak (co-fundador da Apple), Yuval Noah Harari (historiador e escritor), Craig Peters (Getty Images) e Stuart Russell (Diretor do Centro de Sistemas de Inteligência de Berkeley), entre outros, caiu como uma bomba entre a comunidade que trabalha com AI.

Eles pedem, simplesmente, uma interrupção imediata nas pesquisas relacio­nadas à Inteligência Artificial, que seriam retomadas apenas após o estabeleci­mento de uma normatização sobre o quanto ela pode avançar e como deve ser esse avanço. Trecho da carta: “… nos últimos meses temos visto laboratórios de IA engajados em uma corrida descontrolada para desenvolver e implantar mentes di­gitais cada vez mais poderosas, que ninguém – nem mesmo seus criadores – pode entender, prever ou controlar de forma confiável”. O bicho-papão está na porta e ela está destrancada. Eita!

Na próxima semana terei mais subsídios para aprofundar esse assunto. Até lá.

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