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Meu irmão Rubão (Du)

Sentado no meu cantinho onde crio minhas crônicas, tento es­crever sobre meu irmão Rubão, quatro anos mais novo. Está difícil, mas devo essa a ele. Rubão nasceu Rubens Antonio Bueno. Ainda no colo de nossa mãe, eu querendo me engraçar com ele, falar seu nome, e por mais que tentasse pronunciar “Rubens” não conseguia. Daí tasquei-lhe o apelido de Du, não sei de onde veio essa pequeni­na palavra, mas me dava bem chamando-o assim.

Eu com quatro anos, acabou que a vida foi em frente e era Du pra cá, Du pra lá… Só sei que até seus filhos o chamavam pelo apeli­do e eu achava o máximo. Nosso pai era ferroviário da Companhia Mogiana de Estradas de Ferro, a ferrovia chegava à estação no senti­do Cravinhos-Ribeirão Preto, por onde hoje é a avenida Caramuru, e cruzava o rio rumo à estação, justamente onde tem hoje aquela ponte que sai do terminal urbano.

Entre a rua Guatapará e a ponte havia uma colônia da com­panhia onde morávamos, as casas beiravam o rio cheio de pés de cajá-manga. Meu pai sempre repetia, muito enérgico: “Olha aqui, moleque, você é mais velho, sua obrigação é tomar conta de seu irmão”. Nosso ferroviário foi promovido, mudamos pra Cajuru… Nossa mudança era quase nada, tanto que coube num canto de um dos vagões da velha maria-fumaça.

Cajuru nos deu mais duas irmãs e a prole do meu pai se comple­tou, quatro mulheres e dois homens. Eu e Du tínhamos um mundo para brincarmos, um pátio enorme. Um belo dia, estávamos brincan­do e um coleguinha levantou uma placa de ferro pesada, Du colocou seu dedinho num pequeno buraco e o amiguinho soltou-a, esmagan­do a pontinha de seu dedo fura bolo da mão esquerda. Ele tinha dois anos e eu, seis. Sobrou pra mim. Até hoje me culpo por isso.

De volta a Ribeirão Preto, me vem num lampejo nossa infância. Morávamos na Vila Amélia, na baixada tinha um campo maravilho­so, grandes rachas realizávamos ali. Numa bela tarde, me meti numa briga, coisa de moleque. Du estava distante e viu que tava dando ruim pra mim. Eram três contra um. Ele veio correndo, dando voa­dora pra tudo que é lado. Então, eu pensei: “Irmão é irmão, apanha e bate junto.” Só sei que a briga acabou e o jogo seguiu em frente, a vida também.

Na Vila Amélia, Du conheceu Cidinha, o grande amor de sua vida. Tiveram três filhos: Camila, Daniel e Vitor. Camila e Vitor moram na Austrália, Daniel em São José do Rio Preto. Em 1970, nos mudamos para o Jardim Independência. Meu pai, doente, escreveu uma carta e pediu-me que só a abrisse depois que ele partisse. Hon­rei seu pedido. Quando ele se foi, abri a carta e li a mensagem: “Meu filho, cuide de seu irmão por mim”.

Brincava sempre com meu irmão dando uma de durão: “Me obedeça, moleque, olha o pedido do nosso pai, hein!” No final de outubro, uma tosse seca começou a incomodar meu irmão Du, ele foi até a UPA da Treze de Maio, fez exames, era suspeita de covid-19. Foi medicado, seu caso foi piorando, acabou parando novamente na UPA, dali Beneficência Portuguesa, UTI…

Estava com ótima aparência nas fotos, mas o rim parou e eu me perguntava: “Como pode esse vírus estar derrotando este homem de 100 quilos?” Mas tinha que ser, assim é a vida, esse foi seu tempo e lá se foi aos 68 anos meu irmão Rubão, o nosso Du. Cidinha, mulher guerreira, lutou bravamente, mas, tinha que ser assim.

Muitas pessoas passam pela terra sem que sejam notadas, mas Rubão, nosso Du, deixa marcas eternas de amor, de irmão adorado, de amizade, bondade, pai maravilhoso, marido exemplar, de vovô amado, um ser humano de primeira, da mais alta qualidade.

Pro meu pai que o acolheu em seus braços lá na espiritualidade, digo que cumpri a missão.

Sexta conto mais.

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