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A baixa qualidade na educação básica reproduz as trevas

A partir do final da década de 1970, o Brasil experimentou um movimento social vindo da base da pirâmide, que começou com as comunidades eclesiais de base da Igreja Católica, e ajudou a população pobre a aprender os seus direitos e deveres, e que a participação na vida política era uma maneira de emancipação e da construção da cidadania. A força deste movimento se refletiu na participação das famílias na educação dos seus filhos no ambiente escolar – tempos de luz.

A dimensão da grandeza deste movimento se materializou no capítulo Educação da Constituição cidadã, mostrando que a práti­ca e a teoria criam à práxis, mas a beleza deste movimento de civi­lidade foi sendo minado aos poucos, primeiro pela própria Igreja, e pelos conservadores, pois para eles é um perigo os mais pobres terem autonomia, e descobrirem que podem mudar a história – e isso não é admissível.

Quando a Constituição foi promulgada, houve um ataque deliberado por parte daqueles que nunca admitiram que algum dia o País fosse uma Nação, mas mesmo com o nosso histórico de desrespeito às leis, a maioria acreditou que vivíamos novos tempos, e que finalmente a Carta Magna seria a Bíblia, como acontece nos países democráticos. No entanto, o sonho da maioria, com o tempo, se transformou em pesadelo, e chegamos aos dias de hoje num clima de retrocesso e desconstrução do que seria uma Nação.

O que é histórico em nosso País se repetiu, e o costume vezo de não se cumprir as leis deturparam e minimizaram os efeitos benéfi­cos da Constituição chamada cidadã na educação básica. E o resulta­do de não se cumprir a legislação na educação básica forma um País com quatro níveis de analfabetismo: o analfabeto total, o analfabeto funcional, o analfabeto de conteúdo, e o analfabeto político (ou de cidadania), e com isso vivemos numa gangorra institucional.

O primeiro Plano Nacional de Educação, de 1962, previa na pri­meira diretriz a erradicação do analfabetismo, diretriz que se repete no plano de 2014 – conclusão: andamos de lado. A evasão escolar, e a formação de um contingente anual de analfabetos funcionais é o sinal inequívoco que estamos no caminho errado. O Programa Edu­cacional de Adultos, destinado aos que não tiveram oportunidades de frequentar a escola na idade adequada, se transformou no EJA (Educação de Jovens e Adultos), que começou a acolher os jovens expulsos ou evadidos das escolas convencionais, e hoje são maioria neste programa. “Alguma coisa está fora da ordem”.

O grande Paulo Freire já alertava sobre os malefícios de uma educação bancária, e da falta de autonomia dos professores e dos educandos, que contribuem para formar objetos ao invés de formar sujeitos. O formato de educação que privilegia somente a figura do professor, como o único detentor do saber não cabe mais no século 21, o formato de salas de aulas com um aluno olhando para a nuca do outro reproduzem o século 19, com uma única diferença – o mobiliário é moderno.

As mudanças tecnológicas ocorridas no final do século 20 se intensificaram no século 21, mas a escola continuou petrificada, e com isso os atritos entre os alunos do século 21, e a escola do século 19, se tornaram inevitáveis.

A educação tradicional se perpetuou, e abril o caminho para o fundamentalismo religioso, que havia arrefecido, e os preceitos cons­titucionais foram abandonados em nome de dogmas e preconceitos religiosos, e a educação que deveria ser libertadora e formadora da cidadania, cai na vala comum a espera do salvador da pátria.

A liberdade de cátedra do educador tem que ser usada para construir um novo educando, que será forjado dentro da cidadania. Isso não será tarefa fácil, pois o ambiente escolar está contaminado pelo tradicionalismo e autoritarismo, e estas mazelas só poderão ser combatidas com rebeldia e perseverança. A educação de qualidade ilumina, e é só com ela que sairemos das trevas atuais.

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